Mostrar mensagens com a etiqueta Livros 2012. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Livros 2012. Mostrar todas as mensagens

28.12.12

#1 [isto lembra-me o ódio de algumas pessoas às osgas...]

Uma vez eliminada a mígala, somos devorados pelos mosquitos de que ela se alimentava.
Aprendemos a preferir as mígalas.
De resto, elas não picam.

Daniel Pennac in
O Ditador e a Cama de Rede
(depois de ler em italiano, agora estou com a versão tuga)

25.12.12

#1 [não foi nada]

Atravessei Não foi Nada, do chileno António Skármeta, em pouco menos de três horas. Boa maneira de justificar uma pausa e aproveitar o feriado para descansar um pouco.
Começando pelo fim, achei o livro um verdadeiro elogio ao proselitismo. Não só pela história que conta, mas sobretudo pelas razões que a motivam e que Skármeta tão bem descreve no prólogo da obra.
Lucho é um adolescente chileno que vive em Berlim em virtude do exílio que lhe foi imposto, tal como a centenas de milhar de chilenos e Chilenas, pelo pulha Pinochet e seus carniceiros. Tem saudades do Chile e do sol. Quer regressar (já para o ano, pensa ele), mas, contrariamente aos pais e seus amigos, não vive fixado na memória do que se passava um ano antes da chegada ao cinzento centro da Europa e, sempre solidário com os seus, procura fazer o seu caminho.
As revoluções e as resistências também são feitas de ternura.

12.11.12

#1 [Leituras clandestinas]

No último mês estive ocupado com a SARA, que não é uma miúda gira mas um vórtice para onde me joguei e que me tem ocupado o tempo e obrigado a desmultiplicar as horas livres e a capacidade de trabalho. Não me queixo.
Mas este fim-de-semana decidi quebrar o ritmo e dar-me às artes. Vi o filme de que se fala no último post e li A Aventura de Miguel Littín, Clandestino no Chile, de Garcia Márquez.  
Tal como no Relato de um Náufrago, Gabo recorre a um trabalho de jornalismo em forma de romance para (re)contar o relato que o realizador Miguel Littín lhe fizera sobre o seu regresso ao Chile para fazer um filme sobre a vida do seu país 12 anos depois do miserável golpe de pinochet.
Sobre a ousadia de, sendo um proscrito, regressar ao Chile e filmar até dentro do palácio de La Moneda, onde se cruzou com o sinistro ditador, Littín diz que mais que um acto de heroísmo este foi sobretudo um episódio de dignidade. O livro, tal como o filme, não o deixam mentir.

2.10.12

#1 [quentes e boas]

La Tronchita - Daniel Mordzinski 
Era inevitável. Ainda resisti uns meses, mas acabei por voltar a cair na tentação. Por várias vezes me abeirei dele para sentir o magnetismo e, numa espécie de masoquismo, para me contrariar.
Neste tempo de vacas anorécticas, os livros continuam a ser um tesouro e um bem de primeira necessidade emocional, mas cada compra requer uma complexa cadeia de decisões…
Para que raio quereria eu mais um livro escrito por um chileno viajante se já lhe li a obra toda? Ainda por cima ilustrado com fotografias de outro mestre?… logo eu, que nem gosto disso dos retratos em branco e preto.
Pior: o livro conta histórias do sul. Mais, traz-nos o cheiro dos velhos cafés de Buenos Aires, episódios da Patagónia e das suas gentes, os ventos dessa cordilheira que, num repente, quebra na estepe, recordações dos hippies de El Bolson e de outras personagens que um dia cruzaram o meu caminho (terá sido real?)….
Não resisti e li, de um só trago, as Últimas Notícias do Sul, de Luís Sepúlveda e Daniel Mordzinski. Para castigo, passei um mês a remoer a estupefacção e a ensaiar estas palavras.
Enfim, era inevitável...

29.9.12

#1 [como numa pintura de Magritte]

Friend of order - René Magritte
Recuperei recentemente, das profundezas da minha estante uma edição d'O homem que via passar comboios, um dos expoentes da obra do belga Georges Simenon.
Enquanto o lia, fui assaltado pela sensação, muito gráfica, de que estava a entrar numa pintura do seu compatriota (e contemporâneo) René Magritte. Uma ideia provocada por uma escrita também ela marcada pelo olhar para lá da forma, por um questionar da simplicidade das coisas e do concreto, pela abertura de múltiplas possibilidades à existência...
Ao longo de quatro décadas de vida literária, Simenon assinou quase meio milhar de títulos. A grandeza do número faz supor uma escrita quase permanente e uma imaginação febril.
Embora tenha crescido rodeado pelos seus livros, nunca tinha lido nada deste autor. O primeiro impacto foi bom, vejamos o que mais vai revelar esta porta aberta...

18.9.12

#1 [Um Homem e Duas Mulheres]

Algures no início do ano comecei a ler Um homem e duas mulheres, de Doris Lessing, a desconhecida que em 2007 arrebatou o Nobel da literatura. Gostei do arranque, mas a coisa arrefeceu e o livro ficou estacionado uns meses na mesa de cabeceira e só o acabei agora.
Passados no meio de século XX, os contos têm como cenário a Africa do Sul natal da autora ou Londres e arredores. Conta histórias corriqueiras - a mulher bonita e independente, a curiosidade e repulsa de uma rapariguita pelo velho agricultor que a assedia, a rota de afastamento dos casais.
Um livro que vale, sobretudo,  para conhecer a escrita da autora e a forma feliz como ela lida com o formato  do conto. 

3.9.12

#2 [A taberna da india]

Em A Taberna da Índia, o Mexicano António Sarábia traz-nos alguns dos heróis da primeira globalização - Vespucio, Bartolomé de las Casas, Colombo - fantasiados e colocados à escala humana, na  Sevilha do fim do século XV, cidade portuária de partida e chegada dos navios que atravessavam o "mar tenebroso" em direcção aquilo que ainda se julgava ser a costa oriental da Índia (onde estarão os elefantes?).
Embora seja um romance, recomenda-se a quem ainda tenha ilusões sobre a magnifica fábula dos descobrimentos que se conta nas aulas de história das nossas escolas.

#1 [vencidos da vida]

Eis um facto que desconhecia: antes de editar o primeiro disco, 1967, Leonard Cohen era já um escritor aclamado, tendo publicado 3 livros de poesia e 2 novelas.
Já me tinham passado vários livros pela mão, mas só nestas férias me debrucei a fundo sobre um deles, Beautiful lossers (1966).
A história, psicadélica e religiosa, plena de libertação sexual e com alusões às raízes indígenas do Canadá e ao nacionalismo do Quebeque - Montreal parece ter entrado na minha vida -  é desconcertante mas prende.
O homem sabe escrever, confirma-se. ainda assim, prefiro ouvi-lo cantar :)

13.8.12

#1 [Redux]

Dez anos depois do sucesso do seu primeiro romance, Updike fez regressar Harry “Coelho” Angstrom para, através da mundivisão de um americano médio - que aos 36 já se sente velho! -, nos falar do estado do mundo (ou, vá lá, de certa parte do dito).
Enquanto os primeiros humanos chegam à lua, na terra, no coração da América, há conflitos sociais e raciais que se agudizam, a par de um movimento de libertação da moral estabelecida e da redefinição do lugar das mulheres na sociedade e de uma discussão permanente e radicalizada sobre a guerra do Vietname. É de tudo isto que trata Rabbit Redux, o segundo volume da saga deste Coelho tão especial.

6.8.12

#2 [o último tomo]

Fiz um grande esforço para regressar (é proibido pisar a relva, é proibido ser lírico), fiz café, fiz torradas, fiz coisas, coisas quotidianas. A certa altura, comecei a sentir-me melhor. O tempo continuou a compreender-me: parou de nevar. Abri a janela e o ar tinha um cheiro novo, revigorador. Pus Beethoven no gira-discos. Com ar lavado a entrar-me pelas narinas e Beethoven a sair heroicamente da janela, compreendi pela milésima vez que é sempre tempo de recomeçar.

Dennis Mcshade in
Requiem Para D. Quixote

3.8.12

#1 [Blackpot]

Li de um tiro (acho que a expressão é boa) Blackpot, um texto de Dennis McShade que este guardou numa gaveta, tendo lá ficado 30 anos, até 2009, até que a Assirio e Alvim, em conjunto com os herdeiros de DM, o decidiu publicar.
A história resume-se a uma sequência de ajustes de contas entre mafiosos, uma espécie de ascensão na carreira pela via da pistola, temperada com algum nonsense. Conhecendo a restante obra do autor, fico com a impressão de que, mais do que uma narrativa, Blackpot seria o esqueleto de um texto mais extenso que ficou a aguardar tempo e vontade para ser escrito.
Sei que é paradoxal, mas, apesar da morbidez, fez-me lembrar a Quadrilha de Carlos Drummond de Andrade...

Quadrilha
João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.

Carlos Drummond de Andrade

31.7.12

#1 [Mão Direita do Diabo]

Neste primeiro livro da triologia de Mcshade, surge-nos um Maynard mais existêncial e não tão eclético. Talvez porque não tenha interlucotores à altura ou apenas por falta de inspiração momentânea para as suas parábolas e para os famosos diálogos maynardianos.
Mas o compasso de abertura promete aquilo que já confirmámos no terceiro volume da coisa e o que nos espera no requiem para D. Quixote. É DM puro, duro e muito refinado.

25.7.12

# [As Mulheres da Fonte Nova]

Histórias de luta e resistência no feminino, centradas em 40 anos do século XX mas que se esticam por todo esse centenário que a República já leva.
Alice Brito fala-nos de uma cidade que respira e, qual ser vivo, está em plena mutação. Traz-nos, essencialmente, as suas mulheres, envolvidas por uma escrita ritmada e com substância, nada excessiva na forma, embora recorrendo ao vernáculo em demasia... terá sido, certamente, uma opção consciente e até com razões sociológicas, mas, tenho de concordar com Luísa, há momentos em que aparece forçada.
Ao longo de mais de 300 páginas misturam-se, temperadas com imaginação, algumas personagens coleccionadas ao longo de uma vida (calculo eu...) e "episódios mito" transmitidos de geração em geração. Chega-se ao fim num instante, com a leitura a agarrar e a espicaçar o nervo, alimentando o desejo de uma visita tantas vezes adiada a Setúbal, a verdadeira musa deste livro.
Embora romance, não deixa de ser uma perspectiva diferente da histografia oficial dos Hermanos Saraivas desta vida e da verdade oficiosa, a da luta antifascista, tantas vezes apresentada pela perspectiva de Moscovo.

13.7.12

#1 [...]


(…)
Olhei para Johnny, que estava a fazer-me sinal com a mão. Levantei-me.
-Virei um dia destes – disse eu – Vou ler Walt Whitman para si na sala branca.
- Apollinaire – disse ela.
- O meu francês é fraco. Então, Keats.
- Está bem, Keats – disse ela.
- Um beijo à mana Emília. Um destes dias, na sala branca.
- À tarde, Confúcio. Só venho à tarde. Diga na porta que é convidado da Charlotte Brontë.
Aproximei-me de Johnny. O Zola já não estava na sala.
- Já temos praticamente o homem – disse Johnny. – Agora, é só traçarmos o plano. E tu, que estiveste a fazer?
- Uma conquista.
- Uma conquista?
- Pois. Com esta cara, estas maneiras desastradas e este passado tenebroso.
Saímos.
- Bem. Podemos começar quando quiseres – disse Johnny.
- Começamos hoje – disse eu – Quanto mais cedo acabar, mais cedo leio Keats à Charlotte. 

in Mulher e Arna com Guitarra Espanhola

3.7.12

#1 [O Alegre Canto da Perdiz]

de Paulina Chiziane
 
 Delfina é uma mulher bonita, «uma negra daquelas que os brancos gostam». A história de vida desta Delfina, «dos contrates, dos conflitos, das confusões e contradições», é a história da mulher africana, a história da apocalíptica perda do sonho. Esta mulher debate-se entre «escolher o caminho do sofrimento», o amor que sente por José dos Montes, e eliminar a sua raça para ganhar a liberdade», procurando o homem branco que lhe dará o alimento e o conforto que deseja. Mas o que é o amor para a mulher negra? Na terra onde as mulheres se casam por encomenda na adolescência? O problema arrasta-se ao longo do livro, aparentemente sem solução: «viver em dois mundos é o mesmo que viver em dois corpos, não se pode. Tu és negra, jamais serás branca». Mesmo assim a mulher negra «procura um filho mulato, para aliviar o negro da sua pele como quem alivia as roupas de luto». O sufoco das palavras outrora silenciadas, a valentia e a frontalidade gritam alto nos romances de Paulina Chiziane. Neste diálogo consigo própria, a conhecida escritora moçambicana, mistura imaginação, fantástico, misticismo, num retrato poderoso e peculiar da sociedade e da mulher africanas.

30.5.12

#1 [Gaiola de Fantasmas]


Os corredores do poder são um labirinto, para alguns simples, para tantos indecifrável ou até inimaginável. Há os que se viciam com o cheiro da sua cera, que por eles correm de peito aberto animados por um prazer muito próprio de correr, e quem aprenda a fazer uso do jogo de luz e de sombras para, em nome de um ideal, garantir um muito confortável proveito próprio (e há também quem abomine o poder e o lustro obsequioso que a ele se associa).
Gaiola de Fantasmas, de Cecília Honório, é uma elipse sobre os corredores (quartos, gabinetes e jardins, tanto faz), marcada pela amizade, pelo idealismo e pelas lealdades que se tecem ao longo de uma vida, num país ficcional que, mero acaso, se chama Portugal e é desgovernado pelos interesses de um bloco central pastoso, mais musculado ou associativista, com contas a acertar com uma revolução mal resolvida e borboletas que, ao longo das décadas, mudam de poiso com a naturalidade que só aos ilusionistas assiste.
Declarando interesses, digo que este livro já me havia passado por baixo do nariz nos tempos em que ainda era um projecto. Como não era assunto meu, esperei para ver no que dava. E, tenho agora certeza, deu certo.

20.4.12

#2 [Run rabbit run]

Eis a América do final dos anos 50, marcada pelos confortos da tecnologia, pelas expectativas de uma vida séria (crescer, estudar,casar e ter filhos), a pressão social das pequenas comunidades, a força da igreja e os dramas de quem vive desadaptado.
Falo da estreia de John Updike enquanto novelista, o primeiro livro de uma saga que nos conta a vida de Harry "Rabbit"Armstrong.
Enquanto o lia - demorei semanas, cruzando-o com outros autores - ia-me lembrando sempre de Breathe, canção dos Pink Floyd que, propositadamente ou não, fala dessa corrida contra o tempo que Updike tão bem descreve.
(...)
Run rabbit run
Dig that hole, forget the sun
And when at last the work is down
Don't sit down, it's time to dig another one

#1 [para memória futura]

Li um livro de que não vos posso falar.
Apenas direi que gostei da história e da substância, daquilo que se lê entre as linhas.
Fiz os meus reparos.
Lá para o fim do ano saberão do que falo.

28.3.12

#1 [um livro a menos...]


Poucos são os livros que lí até ao fim com um sentimento de o estar a fazer quase obrigado. Foi o que aconteceu com Bebendo o Mar, de Xavier Queipo.
A ideia de partida até não é má: em 1998 um tradutor, que recentemente descobrira ter uma doença degenerativa galopante nas córneas, recebe a incumbência de traduzir para inglês a última obra de um autor português, até então desconhecido mas que estava bem colocado para vencer o prémio Nobel.
O problema dos livros é que não basta partirem de boas ideias para serem realmente bons. Quando escreveu esta obra, em 2001, o galego Queipo já tinha nome nas letras e alguns prémios, não tendo a sua obra ficado por aqui. Este dado biográfico ainda me impressiona mais, porque, de facto, não percebo algumas boas críticas feitas a este livro. 
O texto é inconstante e sem harmonia, parece que não foi revisto pelo autor (ou, vá lá, por um editor competente). A repetição de termos, de palavras, de frases, de ideias, começa por parecer estilo mas acaba por se revelar uma desagradável e enfadonha muleta de escrita. A abordagem à obra do tal português desconhecido é superficial, sabemos que a tradução avança mas, de facto, é-nos dito muito pouco sobre a relação com a história e a parábola que Saramago (para quem ainda não percebeu) propõe ao leitor… O fim é todo ele martelado, com um drama inesperado e um parágrafo justificativo do mesmo que roça o pretensioso.
Enfim, nem sempre acertamos nos livros.

24.3.12

#1 [como está a rambla hoje?]


Quanto a mim, e não me perguntem onde fui buscar esta ideia, há um trio de escritores que ombreiam na sagacidade e na argúcia dos seus policiais: Daniel Pennac, Andrea Camilleri e Manuel Vázquez Montalbán.
Talvez esteja a comparar o incomparável, a pôr no mesmo prato da balança diferentes frutos, a ser ingénuo na forma como deixo tantos outros (e outras) de lado. Mas estes três, por tantas razões, constituem como que um mito pessoal, um tridente que me espicaça a imaginação.
O mais curioso de tudo é que, se dos dois primeiros conheço bem a obra, só agora cheguei a este catalão de que já era devoto. E, depois de ler o Assassinato no Comité Central, o encanto persiste.  
Numa Espanha a ressacar do fascismo e a ensaiar o regime democrático que se lhe seguiu, Pepe Carvalho, detective criado por Montalbán, é contratado para ir a Madrid resolver o mistério do assassínio de Fernando Garrido, Secretário-Geral (para os fins literários desta obra) do PCE, ocorrido em plena reunião do comité central.