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Razões para uma censura
Ao garantir a sobrevivência do governo, PSD, CDS e os seus comentadores mostraram que, apesar da gritaria com que se costumam tratar, estão com a política da crise e com os interesses que a precipitam. É tempo de lhes dizer basta.
Artigo publicado no Correio de Sintra, 2 de Março de 2011
São curiosas as reacções e a preocupação que se instalaram no país com a apresentação, pelo Bloco de Esquerda, da única moção de censura que, depois de meses, avanços e recuos, voz grossa e ameaças de Passos Coelho e Paulo Portas, deixou de ser apenas uma ameaça retórica.
Da direita à esquerda, muito se tem falado sobre piruetas, oportunismos, voltes de face e (ir)responsabilidade. Estão inconsoláveis os que se tinham como donos desta opção, talvez por terem tirado uma senha na fila de espera ou por se julgarem convencidos de que o Bloco estaria amarrado ao Governo por uma alegre e invisível corrente.
Deixemos de lado o vozear e a cortina de fumo levantada, e centremo-nos nas razões por trás desta iniciativa.
A situação do país é delicada e a população de Sintra sabe-o bem, pois este concelho tem mais de 20 mil pessoas sem emprego, famílias a viver em grande dificuldades, há fome nas escolas e milhares de casas devolvidas à banca por incumprimento. Perante tudo isto, as respostas de PS e PSD, com ajuda pontual do CDS, são as piores. Vejamos algumas.
Nunca houve tanto desemprego, mas querem facilitar a exploração e a precariedade, através do aumento da idade da reforma ou da diminuição das indemnizações por despedimento e da criação de um fundo, pago pelos trabalhadores, para pagá-las.
Em vez de taxarem as fortunas e os grandes negócios, aumentam impostos, cortam salários, subsídios de desemprego ou no abono de família. Os bancos pagaram menos 50% de impostos em 2010 e as maiores empresas adiantaram a distribuição de lucros para fugir a uma taxação excepcional a aplicar este ano.
Não têm uma palavra para exigir à Europa mecanismos de solidariedade e salvaguarda, que defendam as pessoas em vez de, como acontece agora, fomentarem a especulação da banca que nos está a levar, só em juros, 15 mil euros por minuto.
O país continua a pagar submarinos, adquiridos num negócio nada claro, e o buraco que ex ministros do PSD abriram no BPN e que o governo PS nunca quis fechar.
Por seu lado, o PS, que desde 1995 só não foi governo por três anos, acena com papão do regresso da direita ao poder, procurando escamotear o facto de já estar a fazer a política que tanto o parece afligir: privatizações e submissão aos mercados financeiros, desmantelamento do estado social, desregulação do mercado de trabalho... É, pois, urgente censurar esta política, que conduziu o país à crise económica e social e que está a hipotecar o futuro de várias gerações.
Ao garantir a sobrevivência do governo, PSD, CDS e os seus comentadores mostraram que, apesar da gritaria com que se costumam tratar, estão com a política da crise e com os interesses que a precipitam. É tempo de lhes dizer basta.