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[A farsa]
Texto publicado na Edição nº 9 do Correio de Sintra
A visita de Cavaco Silva a Sintra, no âmbito do Roteiro da Presidência para a Juventude, ficou marcada por um episódio que, não tendo sido muito falado, é revelador dos tempos que correm.
A presidencial comitiva começou o dia na casa da Juventude da Tapada das Mercês, equipamento fundamental para a comunidade onde está instalado, um bairro cujos problemas de ordenamento do espaço público tardam em ter solução e onde os sinais de tensão social e exclusão começam a ser indisfarçáveis. Seguiu-se uma deslocação até ao largo D. Rainha Amélia, defronte do Palácio da Vila, para visitar uma mostra de jovens empreendedores do Concelho.
Quem procurou informação sobre tal mostra não teve grande sorte. Na imprensa local, apenas algumas referências, sempre associada à presença do Chefe de Estado. Já no site da Câmara, a única referência era dada pelo convite para a recepção.
Achei estranho, porque estes certames são preparadas com antecedência e alvo de larga publicitação pela Autarquia. É assim que deve ser, para divulgar o que se quer dar a conhecer e estimular a presença de potenciais interessados.
Não participei do beija-mão presidido por um muito inchado vice-presidente da Câmara, acompanhado pelos representantes do PSD, CDS, PS e PCP. Preferi manter-me observador atento, do lado de fora.
Pelas 14h, finda a confusão, dispus-me a apreciar o que ali se mostrava. Para meu espanto, encontrei grande bulício no recinto, com gente em grande azafama a arrumar os stands que, nessa mesma manhã, eu vira ser montados à pressa.
Pergunto-me: será lógico montar uma feira de jovens empreendedores que dura algumas horas de uma sexta-feira quando, no fim-de-semana, Sintra tem milhares de visitantes nacionais e estrangeiros que deveriam ser o público alvo de tal iniciativa?
Na realidade, a Câmara montou uma encenação destinada a dar espaço político ao Presidente da Republica. Foram utilizados recursos da autarquia para uma operação de manipulação da opinião pública e instrumentalizados os jovens de Sintra, os empreendedores e todos os outros.
E muito me espantou que dito o Roteiro tenha passado ao lado dos maiores problemas dos jovens (e da população em geral): o desemprego, a precariedade e os baixos salários... E são problemas incontornáveis neste concelho, onde mais de 20 mil homens e mulheres não têm emprego, a precariedade é promovida até pela autarquia, via Empresas Municipais, e em que o rendimento per capita está abaixo da média.
Tenho em crer que tal esquecimento não foi acidental. O desemprego gera mais precariedade e baixos salários, que são a base de uma nova forma de organização social que faz do lucro e da exploração a lei. Esta mudança está a ser aplicada pelo governo de Sócrates, e aplaudida por quem apoia e sempre apoiou Cavaco Silva: os patrões, o partido de Pedro Passos Coelho e a restante direita.
Quanto terá custado tudo isto? A factura vai ser paga pela autarquia (a tal que está com o tanque na reserva) ou pela Presidência da República? Cá por mim, acho que a conta deveria ser entregue a um qualquer comité de apoio à reeleição de Cavaco Silva.
Passada o primeiro ano de governação deste mandato da coligação de Fernando Seara (já lá vão nove!!), não há dúvidas que, tal como esta mostra, a Dedicação Total apregoada em tempo de eleições não era mais do que uma farsa.