[Agora sim, terminou a guerra fria]
fria. Tudo foi diferente, depois dessa noite de Novembro de 89. O mundo tornou-se unipolar, o projecto capitalista, que procurava ser alternativo ao soviético, transformou-se num desígnio imperialista, onde, mais do que os estados nação, são as grandes multinacionais (e os seus interesses) que ditam as regras.
O colapso do bloco vermelho era por demais evidente. O fim do pacto de Varsóvia e a debandada dos Estados que estavam por detrás da cortina era uma questão de tempo. Sobravam poucos focos desse mundo que ombreou com a velha Europa e a América durante oito décadas.
Sobravam os regimes ditos comunistas na Ásia, que foram lentamente convertidos ao capitalismo de estado, Cuba, que, como então e apesar das dificuldades, foi mantida em isolamento, e um estado que, no coração da Europa, não entrara na onda Soviética e, talvez por isso, não se arriscava a ser arraso pelo fim da sua história.
Nesses dias do início da década de 90 era a Jugoslávia que importava começar a desmantelar. Foi um trabalho moroso e com vários episódios dramáticos.
As circunstâncias da história fizeram com que a Sérvia se tenha transformado no último bastião dessa ideia desalinhada que Tito criou e sabiamente geriu, tornando-se no inimigo público número um para meio mundo. É verdade que os seus dirigentes fizeram por merecer a fama, mas, e isso é que é sempre escamoteado, a violência e o cinismo não foram um exclusivo de Belgrado. Alias, esta é a história dos Balcãs desde os tempos mais remotos.
Durante os últimos 19 anos a Jugoslávia foi laboriosamente desarticulada. Contra a intolerância, pela liberdade, contra o nacionalismo e o fundamentalismo, foi-se alimentando uma política de interesses dos Estados Unidos da América, de diferentes Estados Europeus e de velhas famílias e oligarquias, baseada, precisamente, na intolerância, no extremismo religioso e no nacionalismo.
O último destes episódios é o Kosovo, território que hoje declarou a sua independência. Fazendo um paralelo, com as devidas distâncias, para o povo Sérvio a independência deste território tem o mesmo peso que teria para os portugueses uma secessão de Guimarães ou de Aljubarrota. A Sérvia foi hoje amputada do berço da sua nação.
Contrariamente ao que acontecia com os restantes territórios da Jugoslávia, o Kosovo nunca teve o estatuto de República. Nem podia ter tido, como já se percebeu. Mas o território, e a sua população maioritariamente Albanesa, sempre tiveram um tratamento de excepção, com um nível de autonomia e um peso muito grandes no quadro da Federação. A alteração desse relacionamento deu-se quando os Estados começam a abandonar a Federação e o nacionalismo Albanês começa a ganhar peso e a fazer-se ouvir pela voz de um braço armado que não era mais que uma guerrilha ligada ao tráfico de droga, de armas e de seres humanos, engrossado por criminosos das guerras da Croácia e da Bósnia – o primeiro Ministro Kosovar é um deles.
A loucura de Milosevic e da sua clique, em conjunto com a loucura dos líderes Kosovares radicais e a irresponsabilidade de quem os apoiou, tornaram intolerável e irresolúvel a tensão no território.
Hoje a Sérvia foi derrotada, fechando-se um dos últimos capítulos da guerra fria. Vejamos que consequências terá esta derrota.