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[nos arquivos]
“(...) Porque as pessoas que dão mais valor à estabilidade e que temem tudo o que é transitório, incerto, mutável, construíram um poderoso sistema de estigmas e tabus contra o desenraizamento como força desestabilizadora e anti-social, e assim conformamo-nos a maior parte das vezes, fingimo-nos motivados por lealdades e solidariedades que realmente não sentimos, escondemos as nossas identidades secretas com o selo da aprovação. Mas a verdade escapa-se nos nossos sonhos acordados permitidos pela sociedade, os nossos mitos, a nossa arte, as nossas canções, celebramos aqueles que não pertencem ao grupo, os diferentes, os fora da lei, os excêntricos. Aquilo que proibimos a nós mesmos, pagamos bom dinheiro para admirar num teatro ou num cinema ou nas folhas de um livro. Nas nossas bibliotecas, livrarias ou locais de diversão fala-se verdade. O vadio, o assassino, o rebelde, o ladrão, o mutante, o banido, a mascara, se não reconhecêssemos neles as necessidades que não podemos preencher, não os inventariamos as vezes e vezes sem conta, em cada sitio, em todas as línguas, em todos os tempos e a cada passo.”
Salman Rushdie,
in “O Chão Que Ela Pisa “